quinta-feira, 8 de setembro de 2022

Jornalista Carlos Nascimento faz um relato do " Rio Jacaré Pepira" dos anos 70

Recebí  um texto do jornalista Carlos Nascimento através de um grupo de whatsapp do qual participamos. Com sua autorização, o belo texto abaixo:


" Nos anos de 1970 o Jacaré Pepira era pouco assoreado e de água veloz, gelada e cor amarelo claro. Largo e enviesado fazia curvas na capituva e deixava a areia para os remansos. Nas luas prateadas o lombo dos corimbatás reluzia e os pescadores de fisga os espetavam no silêncio da noite. Tempo dos lendários Moacyr Pica Pau, Zé Miguel Bueno do Prado e Licinho Zorzella, o Rei do Rio. O bote piracicabano descia de popa, com o motor recolhido e o piloteiro invertia o bico pois era mais fácil manobrar com a correnteza na proa. A rodada começava com o sol poente, na ponte de madeira de Brotas, fazenda do Tonicão Bertelli e terminava na ponte da Limeira, pelos lados de Bocaina, ao clarear do dia. Na madrugada a neblina descia e era tudo branco, mas o Vandão Coradi deve ter nascido ali pois sabia o lugar de cada toco, pedra, areal, sumidouro, poço, cipó e corredeira. Noite de bicho era noite escura, calorenta e quieta a ponto de galho estalar. Capivara e jacaré gostavam do escurecer e se mexiam até umas nove horas. Daí por diante fazia frio e alguma paca farfalhava aqui e lá. De certo que algum tiro demos no facho de um Sealed Bean 4515 da GE, farol de avião, naquele Jacaré da mocidade. Não era o mal da destruição e do extermínio, mas o feito de contar a história nas horas mortas da noite interiorana. De manhã cedinho um pão com mortadela e um gole de café frio. Dizia-se que o dourado saía ao alvorecer e nos trechos de água ligeira o piloteiro saracoteava com o barco na esperança de um deles cair no bote. Parece coisa de “paiêro”, mas teve testemunhas a cena de um peixe de nove quilos morto com uma remada que poderia ter furado o barco não houvesse o pescador acertado a cabeça do tal. Por mais que nos critiquem pelos jacarés caçados e as jurupocas caídas  na rede, o rio era de ouro e nele não se fazia xixi pois a água cheirando a peixe nos lavava o rosto, molhava os cabelos e matava a sede com as  mãos em concha".

Texto: Carlos Nascimento.

Nenhum comentário: