quinta-feira, 26 de julho de 2012

A marca "caipira" de sucesso: João Andante

Johnnie Walker transforma João Andante em sucesso

Esta é a história de dois jovens mineiros criadores da marca de cachaça artesanal que provocou grande irritação no gigante Johnnie Walker. Eles são de Passa Tempo, vilarejo de pouco mais de oito mil habitantes, a 148 km de Belo Horizonte. Nome do produto criado: João Andante, tradução literal do inglês Johnnie Walker. A Diageo Brands, holding britânica detentora dos direitos da marca do uísque, acusou de plágio os fabricantes da pinga mineira. 
 
O desenho das duas marcas é representado pela figura de um andarilho, embora de classes sociais absolutamente distintas: enquanto um é lorde, o outro é um jeca. Se antes, a pinga premium brasileira era praticamente desconhecida, limitando-se exclusivamente a dois ou três botecos da Savassi, o bairro boêmio de Belo Horizonte, no final de 2011 ganhou os quatro cantos do País, primeiro via redes sociais, depois nos cadernos de economia e negócios dos grandes jornais. A história da polêmica criação começou em 2003, quando os gêmeos Gabriel e Mateus Lana e o colega de classe Gabriel Silva preparavam o trabalho de conclusão de curso da escola técnica de formação gerencial do Sebrae, Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.
 
 Os três tinham de 16 para 17 anos e receberam a tarefa de “bolar” uma marca e desenvolvê-la em todas as etapas do negócio. Os detalhes já são de domínio público: "Enquanto nossos colegas bolavam redes de shopping center ou montadoras de automóvel, a gente decidiu que queria uma coisa mais simples", contou Gabriel Lana. Os jovens chegaram a pensar em um projeto de padaria, mas acabaram optando por uma marca de cachaça por causa de um primo, Rafael Vidigal, que tinha contatos em alambiques de Presidente Bernardes. O município da Zona da Mata mineira, a 187 km da capital, organiza anualmente um Festival da Cana, caminhando para sua 30ª edição.
A marca foi registrada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). A patente foi pedida em nome do pai dos gêmeos, seu Joel. Naquele momento, os novos empreendedores - que após a formatura decidiram produzir a bebida de verdade para animar as festas e vendê-la aos amigos - nem suspeitavam que o registro salvaria a marca na Justiça. Os mineiros contam que o conceito foi desenvolvido em parceria com a agência júnior de comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), também composta por estudantes. 
 
 O "andante" do nome seria um mix de sertanejo com caixeiro-viajante, que traz produtos da roça para a cidade grande. Em vez de paródia de John Walker, de cuja mercearia em Ayrishire, Escócia, saíram, ainda no século 19, as primeiras garrafas do uísque, a inspiração estaria em Jeca Tatu, de Monteiro Lobato. E no andarilho mineiro Juquinha da Serra, que vagava pela região da Serra do Cipó e lá ganhou uma estátua - até agora imóvel, ao contrário do gigante de pedra que sai andando na propaganda que diz "keep walking". Além disso, reforçam os rapazes brasileiros, a figura impressa na garrafa teria sido copiada do quadro Don Quixote, pintado por Pablo Picasso em 1955. "Uma imagem de domínio público", ressalta outro Gabriel, o Silva: "A cabeça é igualzinha, a espada virou um pedaço de pau e o escudo, uma trouxinha".
 
 Uma argumentação, portanto, na linha no copyleft, o movimento mundial que questiona as leis de direito autoral em nome da criatividade e do sample de ideias. Para eles, os dois personagens tampouco frequentam os mesmos ambientes. Johnnie Walker é encontrado em supermercados, lojas de bebidas e free shops ao redor do mundo. João Andante só se compra pela internet ou pessoalmente. 
 
E em vez de milhões em investimentos em marketing, os mineiros confiam na divulgação da pinga em mídias sociais, como Twitter, Facebook, e no site na internet. No máximo, em uma feira de cachaças. Protegidos pela autorização do Inpi, a dor de cabeça deles foi se transformando em bom humor à medida que o caso se tornou público e as vendas da João Andante cresceram em ritmo acelerado.
 
 Das cerca de 50 unidades mensais que engarrafavam e etiquetavam uma a uma no apartamento de um deles (a cachaça vinha de um alambique terceirizado), a produção saltou para 200 e eles tiveram que escolher outro fornecedor, que também engarrafasse a bebida. Além disso, contrataram outro amigo, Samuel Neves, como gerente comercial. Hoje, com um site na internet (WWW.joaoandante.com.br) e perfis no Twitter e no Facebook, uma média de 900 garrafas/mês de João Andante percorre as rodovias MG 270 e BR 381, de Passa Tempo a Belo Horizonte e, de lá, é despachada para cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília.
 
 Cada uma é vendida a R$ 48, mas o preço em algumas praças pode chegar a R$ 80 - o mesmo de uma garrafa de Johnnie Walker Red Label. A assessoria da holding britânica sugere que a queixa encaminhada ao Inpi, se rejeitada, não deverá virar ação judicial. Com a cachaça passando a ser declarada "produto genuinamente brasileiro", conforme acordo bilateral assinado pela presidente Dilma Rousseff na última visita aos EUA, o céu passa a ser o limite para grandes produtores da bebida. E João Andante tem tudo para caminhar muito, cada vez mais.
Samuel e Gabriel Lana: vendas ainda crescem (Foto Gualter Naves/AE)
Fonte: Sergio Barbalho

Um comentário:

Décio disse...

Ronco,
convenhamos que a criatividade foi na verdade uma tremenda "chupação" da marca inglesa.

Continuo preferindo a Havana.

Décio